5 de novembro de 2013

[Causos] E começou o Outono ☂


Estações com maiúscula, que eu só adoto do Acordo aquilo que me convém. Processem-me.

Assim chega, finalmente, ao país aqui da Península Fim do Mundo, a época fria. Meio fora de horas, mas parece que sou a única a queixar-me; todos os outros afirmam que bem se podia ter atrasado mais um bocadinho, que não fazia mal. Eu cá fiquei chateada por demorar tanto - desculpem se não gosto de caminhar para a escola debaixo de uma soalheira excruciante, enfiar-me numa estufa de plantas tropicais a definhar por osmoses o dia inteiro e ainda ter de usar óculos de sol para não começar a chorar os globos oculares liquefeitos - o que se torna algo para o difícil quando já temos de usar óculos graduados. Dois pares de óculos de uma vez? Que coisa tão linda, é tudo do que a minha fronha precisa.

E aos que alguma vez me sugeriram adquirir óculos de sol graduados - vão comer um carolo. Devem julgar que ando aqui a regurgitar notas de quinhentos.

Eu não sei quanto a vocês, mas a época fria é espetacular. Não sei como é que mais gente não gosta dela. As principais queixas prendem-se com o frio e a necessidade de vestir quarenta peças de roupa para alcançar um estado de mínima sobrevivência humana...

... que eu não entendo. Incompetência minha, mas eu adotei a blusa normal e o sweater de forro duplo, e nunca me dei mal. Ou camisolas de lã. Quem é que não gosta de camisolas de lã? Daquelas pesadonas, grandes, tão largas que dá para esconder um corpo lá dentro - o que dá jeito, certo? Certo? Se possível, com mangas grandes também, com as quais podem esbofetear toda e qualquer alminha rude que se atravesse no vosso caminho.

Além de que, no Inverno, se estiverem com frio, enfiem mais uma blusa ou enfiem-se numa manta de pêlo e pronto, tornam-se um burrito de conforto e felicidade. No Verão, se tiverem calor, destilem. Destilem aí. Ou dispam-se, se não se importam de fazer topless na fila da mercearia. 

E as botas. Como eu adoro botas. Não corro o risco de tropeçar numa pedra e partir uma unha literalmente ao meio, como me acontece literalmente todo santo Verão, porque os meus pés estão protegidos desses perigos que são as pedras da calçada. E botas têm acolchoamento, coisa que faria os meus pés uma poça de suor na época destilatória, mas que são confortáveis e quentes q.b. agora.

Finalizando a parte dasroupa, relembro-vos em tom de gabarolice que tenho um cachecol arco-íris. Ou seja, atinjo o meu máximo de estilosidade na altura em que o posso usar, em conjunto com o meu cabelo de lâmpada semi-chamuscada e os recém-adquiridos óculos; uma hipster maricas, na opinião os bróders - também eles uns maricas.

Depois, aulas. Porque a minha vida académica está a comer a minha existência, e é a situação mais próxima que tenho por agora. O sistema de iluminação da minha escola está programado para desligar com a falta de movimento e/ou depois de certo tempo de estar ligado. O que significa que, de tempos a tempos, a luz desliga e ficamos num breu iluminado pela escassa luz das vidraças - a única que passa por entre as nuvens densas. E já experimentámos esbracejar, ligar ou desligar outra vez, dançar a conga, mas nenhum dos nossos esforços faz a luz se ligar até certo tempo pré-determinado. Significa isto - pausa para siesta.

No outro dia estávamos na aula de Matemática. A luz, como já é habitual, vai abaixo. O professor começa a falar em como a escola está mal conseguida, e tal, e nós a opinar. A informá-lo que para além da luz ter vontade própria, a caldeira está em greve, então não há água quente nos chuveiros. E as cadeiras dos laboratórios estão, na sua maioria, partidas, então escolher uma é a roleta russa do "ou sentas-te na boa ou partes o cóssix". E enfiamos por um debate tão alentado, que a luz volta a acender e nós ainda a conversar. Foi uma pausa construtiva. É sempre bom promover o anarquismo direcionado e o questionar do poder em mentes jovens, se me perguntam.

E as aulas de Educação Física? Quando estamos designados para o espaço exterior, e este está minimamente húmido, não há aula. Vai tudo à sua vidinha, comer um crepe ao café, jogar às cartas no bar e tirar fotos para Instagram. Experimentem, no Verão, pedir ao professor para não haver aula por estar demasiado calor. Experimentem, e contemplem como ele se ri da vossa cara enquanto vos manda dar trinta voltas ao campo.

Outra das queixas também se prende pela chuva; por muito que a malta goste de ouvir o som da chuva lá fora enquanto bebe um chazinho e aquece as pernas com o portátil, a coisa não é tão bonita na eventualidade de se ter de sair no meio da tempestade. 

Só tenho a dizer:


A partir dos 0.33 têm um GPOY meu quando preciso de sair em tempo de chuva.


Para além de todos esses argumentos, ainda apresentam o das doenças. O de quão chato é ter de amarfanhar num sofá durante uma tarde livre inteira porque a disposição não dá para mais e a cabeça pesada, o nariz entupido e a tosse seca também não facilitam. E porque, apesar de desconfortáveis, não são justificação suficientemente plausível para faltar a cinco aulas seguidas em prol de ficar em casa a ver séries e a dormir de boca aberta.

Pois, é a parte chata. Mas vejamos pelo lado positivo. Ontem tive de ir ao supermercado em hora de ponta, graças à preguiça de me içar do sofá e ir mais cedo. E, para meu desespero, é prática comum nas gentes da minha terra as pessoas se espremerem umas contra as outras na fila para a caixa. Às tantas fico ensanduichada por entre um homem com ar de estrangeiro e uma senhora baixinha de coque, nenhum deles levantando qualquer problema com todo aquele contacto humano, quando de repente me dá um bruto ataque de tosse.

Graças a tudo. Duas tossidelas profundas e uma pausa para respirar depois,  já tinha quase meio metro livre de cada lado, sem gente a tocar-me nem com os carrinhos sequer. Que maravilha.

Além disso, querem melhor justificação quando forem acusados por uma professora de fazerem uma apresentação oral de Português com uma postura "demasiado despreocupada"? Senhora docente, eu estava drogada com Antigripines até aos poros capilares. Sorte teve você que não me pus aí a dançar o hula e a distribuir bolinhos de canela.

Por isto e por tudo mais, viva a época fria! Aclamemos com ardor este escape à soalheira, e esperemos que dure muito, mas muito mesmo. Para aí uns bons dois anos seguidos. Os que não aguentarem, enfim. Chama-se seleção natural.


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