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Perdoem-me a semana de férias que tirei sem avisar. Tive de colocar algumas coisas em ordem para recomeçar as postagens periódicas, porque não tinha material preparado e tive de tratar disso. Esta sexta feira também não estarei cá, mas vou colocar o post desse dia em queue e esperar pelo melhor.
Por hoje, queria partilhar uma coisa só para cobrir a falta de posts e porque sim. Estou a fazer este Desafio 30 Dias de Escrita, e ao décimo dia pedem uma carta. Deprivada de sono, sob o efeito de cafeína, depois de uma maratona de Night Vale e enquanto ouvia Lindsey Stirling, escrevi uma coisa meio... estranha. Não sei bem de onde saiu isto, mas long story short, pediram-me uma carta e eu sem querer escrevi uma Naomipasta.
Olá.
Sinto muito desde já por não usar o convencional formato de
carta. Apenas não sei o dia, a hora, o sítio de onde escrevo, ou o recetáculo
desta, o que me impede de algo mais formal.
Mas tento. Porque estou a sofrer uma deprivação de sono,
está demasiado calor para o humanamente suportável, e se parar de fazer alguma
coisa, destilo certamente.
Desculpa. Não me conheces e já te estou a atirar queixumes
para cima. Não que não tenhas a tua parte de culpa; também ainda não te conheço. Ou talvez nunca conhecerei. Ou talvez conheça, mas não saiba. Ou talvez
tenha conhecido, e já não me lembre; se for este o caso, dá-me uma data ou um
local, e provável será que me recorde de imediato.
Já divago. Não pensava que o calor me fosse afetar assim
tanto. Se bem que no outro dia foi pior – tive alucinações à custa da
temperatura. Juro-te que vi uma sombra de um gato no teto. A minha gata fica
trancada na cozinha, e mesmo que não ficasse, conheço o perfil da minha felina
doméstica, e aquele não era ela. Decidi ignorá-lo, que os gatos não gostam de
mirones humanos.
Outra vez. Foca-te. Foca-te, que ainda nem te apresentaste.
Chamam-me Naomi ou Nate. Chamam-me pelos meus alter-egos e pronunciam-nos Salem ou Umbra, por vezes.
Chamam-me ele e ela, e eu não discuto. Chama-me o que quiseres, eu trato de
responder. Dizem que tenho dezasseis, que nasci num inverno tão frio como a
minha alma e que chorei quando fui batizada. Que até sou boa pessoa, desde que
não tenha uma consola nas mãos. Que possuo vários talentos, como recitar bulas
de medicamentos de cabeça, imitar os contorcionistas dos circos e olhar para o vazio por tempo indeterminado. Estalo os ossos dos pulsos, dos indicadores, dos tornozelos e dos
joelhos. Se os coordenar, faço melodias que metem Bach no chinelo. E, se nada
disto te impressionar, informo-te que sei reiniciar os cartuchos da impressora.
Já foste.
Gostava de te perguntar quem és, o que fazes da vida e qual
é a tua série preferida, mas sinto que não tenho esse direito. Aturaste as
minhas divagações por um tempo considerável, penso que isso te dê direito à
anonimidade.
Quero dizer, quase anonimidade.
Oh.
Ainda não te contei, pois não?
Enquanto tiveres esta carta
em tua posse, enquanto as letras te dançarem nos olhos mesmo depois de os
fechares, enquanto continuares a ouvir as suas palavras sussurradas de uma
carta destruída ou apagada.
Saberei onde estás.
Desculpa. Não te queria assustar. Tira essa expressão de
leve receio da tua linda face, não te assenta bem. Mas é um aviso que me sinto
obrigada a dar.
Pois no dia em que pronunciares o meu nome. No segundo em
que um “ele” a mim se referir, um sussurrado “ela” que te escape por entre os
lábios em confissão. Eu estarei lá.
Não me verás. Não gosto de ser vista, isso assusta as
pessoas. Já o meu gato, é descuidado. Nunca aparece, mas deixa escapar a
sombra.
Quando vires a sombra do gato, nada temas. Afoga o arquejo, engole
o sobressalto, e prossegue com a tua vida, como se nada fosse.
Só não sigas a sombra do gato.
Não sigas a sombra.
Ou a sombra seguir-te-á.
E acredita.
Tu não queres que eu te siga.
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