18 de agosto de 2013

Não Sigas a Sombra

Fonte
Perdoem-me a semana de férias que tirei sem avisar. Tive de colocar algumas coisas em ordem para recomeçar as postagens periódicas, porque não tinha material preparado e tive de tratar disso. Esta sexta feira também não estarei cá, mas vou colocar o post desse dia em queue e esperar pelo melhor.

Por hoje, queria partilhar uma coisa só para cobrir a falta de posts e porque sim. Estou a fazer este Desafio 30 Dias de Escrita, e ao décimo dia pedem uma carta. Deprivada de sono, sob o efeito de cafeína, depois de uma maratona de Night Vale e enquanto ouvia Lindsey Stirling, escrevi uma coisa meio... estranha. Não sei bem de onde saiu isto, mas long story short, pediram-me uma carta e eu sem querer escrevi uma Naomipasta.



Olá.

Sinto muito desde já por não usar o convencional formato de carta. Apenas não sei o dia, a hora, o sítio de onde escrevo, ou o recetáculo desta, o que me impede de algo mais formal.

Mas tento. Porque estou a sofrer uma deprivação de sono, está demasiado calor para o humanamente suportável, e se parar de fazer alguma coisa, destilo certamente.

Desculpa. Não me conheces e já te estou a atirar queixumes para cima. Não que não tenhas a tua parte de culpa; também ainda não te conheço. Ou talvez nunca conhecerei. Ou talvez conheça, mas não saiba. Ou talvez tenha conhecido, e já não me lembre; se for este o caso, dá-me uma data ou um local, e provável será que me recorde de imediato.

Já divago. Não pensava que o calor me fosse afetar assim tanto. Se bem que no outro dia foi pior – tive alucinações à custa da temperatura. Juro-te que vi uma sombra de um gato no teto. A minha gata fica trancada na cozinha, e mesmo que não ficasse, conheço o perfil da minha felina doméstica, e aquele não era ela. Decidi ignorá-lo, que os gatos não gostam de mirones humanos.

Outra vez. Foca-te. Foca-te, que ainda nem te apresentaste.

Chamam-me Naomi ou Nate. Chamam-me pelos meus alter-egos e pronunciam-nos Salem ou Umbra, por vezes. Chamam-me ele e ela, e eu não discuto. Chama-me o que quiseres, eu trato de responder. Dizem que tenho dezasseis, que nasci num inverno tão frio como a minha alma e que chorei quando fui batizada. Que até sou boa pessoa, desde que não tenha uma consola nas mãos. Que possuo vários talentos, como recitar bulas de medicamentos de cabeça, imitar os contorcionistas dos circos e olhar para o vazio por tempo indeterminado. Estalo os ossos dos pulsos, dos indicadores, dos tornozelos e dos joelhos. Se os coordenar, faço melodias que metem Bach no chinelo. E, se nada disto te impressionar, informo-te que sei reiniciar os cartuchos da impressora. Já foste.

Gostava de te perguntar quem és, o que fazes da vida e qual é a tua série preferida, mas sinto que não tenho esse direito. Aturaste as minhas divagações por um tempo considerável, penso que isso te dê direito à anonimidade.

Quero dizer, quase anonimidade. 

Oh.

Ainda não te contei, pois não?

Enquanto tiveres esta carta em tua posse, enquanto as letras te dançarem nos olhos mesmo depois de os fechares, enquanto continuares a ouvir as suas palavras sussurradas de uma carta destruída ou apagada.

Saberei onde estás.

Desculpa. Não te queria assustar. Tira essa expressão de leve receio da tua linda face, não te assenta bem. Mas é um aviso que me sinto obrigada a dar.

Pois no dia em que pronunciares o meu nome. No segundo em que um “ele” a mim se referir, um sussurrado “ela” que te escape por entre os lábios em confissão. Eu estarei lá.

Não me verás. Não gosto de ser vista, isso assusta as pessoas. Já o meu gato, é descuidado. Nunca aparece, mas deixa escapar a sombra.

Quando vires a sombra do gato, nada temas. Afoga o arquejo, engole o sobressalto, e prossegue com a tua vida, como se nada fosse.

Só não sigas a sombra do gato.

Não sigas a sombra.

Ou a sombra seguir-te-á.

E acredita.


Tu não queres que eu te siga.

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